quinta-feira, 3 de julho de 2014

Adailton Alves Teixeira

Adailton Alves Teixeira é Diretor, ator, palhaço e professor de teatro. Graduado em História pela UNICSUL; mestre em Artes - Área de Concentração: Artes Cênicas, pelo Instituto de Artes da UNESP, com a pesquisa sobre o território e a identidade como norte do processo de criação para o teatro de rua. É membro fundador do grupo Buraco d`Oráculo, do Movimento de Teatro de Rua de São Paulo, da Rede Brasileira de Teatro de Rua e do Núcleo Brasileiro de Pesquisadores em Teatro de Rua.

Foto: Arquivo pessoal do artista.


Tecendo em Reverso - Em quais circunstâncias se deu a criação do Buraco d’Oráculo? Qual é o referencial estético do grupo?

ADAILTON ALVES TEIXEIRA – O grupo surgiu em 1998 em um projeto coordenado por João Carlos Andreazza, na Oficina Cultural Amácio Mazzaropi; tratava-se da criação de um núcleo de teatro de rua, com aulas de interpretação, expressão corporal, criação musical etc. e ao terminar uma montagem teatral. Teve a duração de dez meses. Esses processos quase não se veem mais...
Depois o grupo passou por outro projeto, o Ademar Guerra, sendo orientado por Ednaldo Freire, diretor da Fraternal Cia. De Artes e Malas-Artes. Esses dois processos são fundantes e fundamentais na história do grupo. O primeiro mostrou a rua como possibilidade cênica e o segundo nos aproximou da estética popular, consequentemente, de um público que não frequentava as salas de espetáculos.


                                                           Foto: Divulgação


Tecendo em Reverso - Suas pesquisas na Unesp direcionavam-se pelo viés do “território e a identidade como norte do processo de criação para o teatro de rua”. Como você avalia a atuação dos coletivos artísticos atualmente nas ruas das grandes cidades?

ADAILTON ALVES TEIXEIRA – Os coletivos de teatro de rua são essenciais nos grandes centros urbanos e também nas pequenas e médias cidades, por muitos motivos. Destaco alguns: a possibilidade de acesso da arte teatral; a ressignificação dos espaços públicos abertos, o que faz com que os cidadãos se relacionem com sua cidade de outra maneira, criando afetividade com os locais das apresentações; nas cidades pequenas, em geral, não há edifícios teatrais, então aí, a praça torna-se fundamental como local de encontro e das trocas simbólicas.
Hoje, cada vez mais é preciso olharmos com atenção a questão do território, na medida em que a própria cidade se torna uma mercadoria, então a arte entra também na disputa de que cidade se deseja, que se quer. E, claro, isso também acaba norteando, influenciando os processos de criação dos grupos. Mas não tem sido fácil, na medida em que a cidade entra na lógica mercadológica, começa a perseguição aos artistas populares e temos visto isso ocorrer em diversas cidades grandes e pequenas, bem como em metrópoles como Rio de Janeiro e São Paulo. A disputa pelo espaço é diária. Então, entender o que é território na atualidade é importante tanto para quem faz arte, quanto para aqueles que apenas se relacionam com ela, que fruem.

                                                            Foto: Divulgação

Tecendo em Reverso - Como foi concebida a “Ópera do Trabalho”?

ADAILTON ALVES TEIXEIRA – Ópera do Trabalho é o último espetáculo do Buraco d`Oráculo, criado em 2013, mas que vem de um processo anterior. No grupo, um projeto acaba desencadeando no seguinte, isto é, uma determinada pesquisa que estamos realizando, seja teórica ou estética, acaba sempre tomando outros desdobramentos. Isso ocorreu com a Ópera do Trabalho. O grupo vinha pesquisando a história de algumas comunidades do extremo leste da cidade de São Paulo para a construção de outro espetáculo, isso nos levou a questão da precarização do trabalho na contemporaneidade. Por outro lado, a música sempre esteve presente em nossos estudos e queríamos verticalizar essa pesquisa. Então aliamos essas duas pesquisas, ao mesmo tempo em que abrimos espaço para outras pessoas, isto é, criamos oficinas de formação para criarmos um espetáculo com mais pessoas além dos integrantes do grupo.
Todo o processo foi coletivo, como tem sido tudo o que temos feito, pessoas do projeto e mesmo de fora contribuíram com criações, dicas, conversas, críticas... É um espetáculo em que a dramaturgia está organizada pela música, o que é um caminho novo para o grupo e, em certa medida, no teatro de rua. A experiência de um teatro musical não é nova, já foi muito experimentada, mas na rua, não se sabe de muitas experiências nesse sentido. Então estamos colhendo as dores e as alegrias desse processo.

                                                     Foto: Divulgação

Tecendo em Reverso - Qual é a influência de Brecht no teatro épico brasileiro?

ADAILTON ALVES TEIXEIRA – Embora Brecht tenha chegado ao Brasil pela via comercial, mas uma ideia fora do lugar como tantas outras, rapidamente ele é apropriado pelo Teatro de Arena, que começa a experimentar e a disseminar as proposições do teatro épico. Hoje, todos os grupos utilizam procedimentos épicos, ainda que não sejam, necessariamente, brechtianos, ou seja, os grupos utilizam procedimentos estéticos característicos do teatro épico estudados por Brecht e Piscator, mas não necessariamente fazem um teatro em que a função social está em seu horizonte, isto é, nem sempre há preocupação com o desvelamento da sociedade em que vivemos.
Quanto ao teatro de rua, este é épico por definição, na medida em que não é possível fazer um teatro de rua fechado, sem relação direta com o público, etc., mas isso não significa também que todo teatro de rua desenvolva propostas cênicas preocupados com o tempo presente e nossas relações sociais. Nesse sentido, a importância de Brecht vem no sentido de mostrar como olharmos a sociedade, as relações sociais em que estamos todos envolvidos. A rua, nesse sentido, ganha outra importância, pois está em um espaço, em tese, de todos. O teatro que se coloca aí precisa ter a consciência da importância da disputa do imaginário das pessoas que se deparam com a obra artística.


Conheça o trabalho do artista:




Juliana Gobbe


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