terça-feira, 1 de agosto de 2017

Vera Lucia Martiniak

 Vera Lucia Martiniak é graduada em Comunicação Social pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (1993) e em Pedagogia pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (1998). Possui mestrado em Educação pela mesma Universidade (2003) com doutorado também em Educação pela Universidade Estadual de Campinas –UNICAMP. Atua como professora de Pós-Graduação na UEPG e é membro do grupo HISTEDBR.
Em sua pesquisa no pós-doc sob orientação do Prof.Dr. José Claudinei Lombardi na UNICAMP a pesquisadora debruçou-se sobre a temática das escolas étnicas na província do Paraná. Confiram:




                                                                          Foto: Arquivo pessoal da pesquisadora.


Tecendo em Reverso – Quais as demandas que a levaram a ter como objeto de pesquisa no pós-doc: “Trabalho, educação e imigração: Constituição das escolas étnicas na província do Paraná”?


VERA LUCIA MARTINIAK – Primeiramente, a intenção de pesquisa originou-se pela continuidade e aprofundamento das pesquisas desenvolvidas pelos pesquisadores do HISTEDBR – GT Campos Gerais, PR, que tem focado suas pesquisas nos últimos anos sobre a história das instituições escolares, nas quais têm convergido para alguns temas em comum, tais como: imigração, escravidão e educação pública. Para tanto, os pesquisadores têm utilizado diversas fontes para o desenvolvimento dos seus estudos, desde a imprensa até documentos oficiais e cartas pessoais.
A partir disso, por meio de análise da historiografia, tanto regional quanto nacional, apontou-se para a necessidade de investigar com mais profundidade a relação entre o trabalho livre e assalariado, a educação e a criação das escolas étnicas, subvencionadas e particulares, para atendimento da população imigrante. O Paraná recebeu um número significativo de imigrantes de diferentes etnias que se organizaram para se manterem na província, porém, essa temática ainda é pouco abordada nos estudos dos pesquisadores. Essa questão suscitou a inquietação em compreender os motivos que levaram a constituição das escolas étnicas na Província do Paraná a partir de novos parâmetros impostos pelo setor produtivo e a ausência do poder público para a criação e manutenção de instituições escolares para atendimento da população brasileira e imigrante. Diante da omissão do governo os imigrantes organizaram-se nas colônias para oferecer a instrução primária para seus filhos.
Muitas escolas criadas pelos imigrantes mantêm-se em funcionamento até os dias de hoje e são referência, histórica e educacional, para a sociedade brasileira.  
   


Tecendo em Reverso- Diante do caráter ideológico vigente à época delimitada por sua pesquisa. Como se deu a compreensão da institucionalização das escolas de imigrantes?


VERA LUCIA MARTINIAK – Os imigrantes, como em sua terra de origem, consideravam que as autoridades deveriam prover a população com a oferta de ensino público nos núcleos coloniais. Entretanto, diante do quadro educacional paranaense desanimador, eles criaram as suas próprias escolas, responsabilizandose pela instalação e manutenção, tanto do professor quanto da estrutura escolar. Cabe destacar ainda, que as escolas criadas pelos imigrantes atendiam também a população brasileira que residia próximo das colônias.


Tecendo em Reverso- O que caracterizou a inserção do imigrante europeu no sistema produtivo brasileiro?


VERA LUCIA MARTINIAK – A imigração europeia ocorreu devido a expropriação dos meios de produção dos trabalhadores na Europa e o consequente descontentamento da população que ocasionou a saída de grande parte da população para outras regiões do continente e do ultramar. Entretanto, muitos foram iludidos e enganados com falsas promessas e propagandas que prometiam terras, acesso à condições e bens materiais. Ao chegarem nas terras brasileiras não lhes restava outra alternativa que não fosse a venda de sua força de trabalho. Muitos precisaram submeter-se aos contratos de parceria com latifundiários que causaram endividamento ou ainda, aceitar o trabalho assalariado nos centros urbanos.
A necessidade do emprego da força de trabalho nas lavouras de café fez com que o Brasil se tornasse destino dos imigrantes europeus, porém, no Paraná, o processo de absorção desses imigrantes visou o abastecimento do mercado interno com a produção de gêneros de primeira necessidade. A vinda de imigrantes significou a diversificação de usos de instrumentos e técnicas na produção agrícola, com estímulo à economia para o mercado interno de gêneros alimentícios e também, como pano de fundo, o branqueamento da população brasileira.


Tecendo em Reverso – Como delineava-se ao final do século XVIII a situação educacional na província paranaense e de que forma este contexto influenciou as novas propostas?


VERA LUCIA MARTINIAK – Depois da emancipação da Comarca de São Paulo, a educação na Província do Paraná encontrava-se em estado precário. Até então, por ser uma extensão da economia paulista, a relação com a Comarca, devido à distância, era de descaso e negligência com as necessidades do interior. Apenas uma minoria da população frequentava os cursos de primeiras letras, o ensino secundário era praticamente inexistente e o pouco que havia em Curitiba atendia a demanda local e do interior da Província. A máquina administrativa recém constituída foi representada por homens que se dedicavam ao comércio, e um dos desafios dessa elite foi atrair os governados para sua administração. A instrução pública foi utilizada para chamar a atenção da população, pois além de o governo conquistar maior visibilidade por meio da educação, teria também mão-de-obra com melhor formação.
A situação educacional da província era extremamente difícil, pois, sofria com a ausência de professores e escolas, e essa carência preocupava as autoridades locais, pois a população crescia e necessitava de uma educação escolarizada. Existiam poucas unidades escolares, tanto no que se refere ao ensino de primeiras letras como ao ensino de nível secundário. Um outro aspecto que merece atenção diz respeito à infraestrutura desse ensino. Como as escolas não tinham prédios próprios para a realização das aulas, a solução encontrada foi mantê-las em casas alugadas pelo Estado.


Tecendo em Reverso- Na sua pesquisa lemos: “É perceptível o caráter elitista e discriminatório na educação brasileira, o ensino trazia resquícios da época de sua implantação, ou seja, era voltado para o atendimento da elite, sem nenhum compromisso com as classes populares, principalmente filhos de escravos e imigrantes”. De que forma esta perspectiva se desdobra na atualidade brasileira?



VERA LUCIA MARTINIAK – Do ponto de vista educacional, as políticas públicas implementadas no país tornam visível um processo dualista que se configura na exclusão da classe trabalhadora e no impedimento do acesso ao conhecimento necessário para a emancipação dos indivíduos. As políticas educacionais necessitam ser coerentes com uma educação pública e de qualidade e para tanto, a educação não deve ser utilizada, como vem acontecendo historicamente, para agravar e perpetuar uma sociedade de classes na qual o modo de produção material continua centralizado nas mãos de poucas pessoas.

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