terça-feira, 24 de maio de 2016

Ana Carolina Galvão Marsiglia

Em O que acontece com as crianças o poeta gaúcho Mário Quintana discorre sobre a sua meninice e a forma como começou a escrever. Imerso no que chamou de “mundaréu de história” ele nos conta o seu processo de encantamento em relação aos livros. O autor também aproveita para escrever nestas linhas poéticas dos anos 70 o seguinte:
“Ora, as crianças de hoje não se acostumam a ler correntemente, porque apenas olham as figuras dessas histórias em quadrinhos, cujo “texto” se limita a simples frases interjeitivas e assim mesmo muita vez incorretas.”
O fato das nossas crianças estarem até hoje relegadas às modas teóricas que pouco ou nada contribuem para emancipação humana não é nenhuma novidade. A educação brasileira vai mal, mas entre tantos disparates acadêmicos surgem aqui e acolá professores e pesquisadores extremamente sérios e realmente preocupados com a infância.
Ana Carolina Galvão Marsiglia é doutora em Educação pela Unesp ( Araraquara). Sob a orientação de Dermeval Saviani realiza atualmente o seu Pós-doutorado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).  Atua também como professora no Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e no Programa de Pós-Graduação em Educação da mesma Universidade.
Entre suas obras mais conhecidas destacamos: A prática pedagógica histórico-crítica na educação infantil e no ensino fundamental e As perspectivas construtivistas e histórico-crítica sobre o desenvolvimento da escrita.
Nesta entrevista Ana Carolina discorreu sobre a educação infantil e, também sobre o Seminário que está organizando para o mês de outubro no Espírito Santo: Dermeval Saviani e a Educação Brasileira.


                                                                       Foto: Raphael Teixeira


Tecendo em Reverso - Dentre outras temáticas, um dos assuntos estudados por você é a infância sob a perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica. Quais são hoje os maiores problemas enfrentados por professores na educação infantil brasileira?

ANA CAROLINA GALVÃO MARSIGLIA – Os problemas que se apresentam para a educação brasileira em geral são diversos. Vão desde as questões de infraestrutura, que influenciam na atividade do educador (como superlotação de salas, falta de material pedagógico, espaços físicos etc.), passando por aspectos relacionados à autonomia dos professores (instituição de mecanismos de controle coercitivo e meritocráticos), chegando até à problemática da formação docente e as questões salariais, jornada de trabalho etc. No caso da educação infantil, não é diferente. No entanto, há uma particularidade no caso desse segmento que é uma maior desvalorização da docência na educação infantil, do que em outros níveis e modalidades de ensino. Com esmagadora maioria de mulheres em exercício, a educação infantil é confundida com maternagem, que se expressa em jargões de senso comum, que associam “ser boa mãe”, “gostar de crianças” como critério para ser uma boa professora. A própria forma como as crianças são incentivadas a chamarem suas professoras (“tia”) expressa essa confusão de papéis familiares com a atividade profissional. E isso, em boa medida, contribui para que a educação infantil seja compreendida como espaço de desenvolvimento de afetos, como se fosse possível separá-los do desenvolvimento cognitivo das crianças. As consequências são (entre outras), por um lado, a desqualificação dos profissionais desse segmento e por outro, o entendimento de que a educação infantil está muito mais ligada ao cuidado do que à educação, criando uma dicotomia entre esses aspectos que é infrutífera à formação das crianças. Mas, se historicamente a educação infantil vem de uma tradição de assistencialismo, o que ajuda a explicar essas questões, também não podemos desconsiderar que isso continua acontecendo com o apoio de ideias dominantes que, para os pequenos, se expressa em discursos como a “Pedagogia da Infância”, que defende o afastamento do tratamento da educação infantil como escola, como espaço formativo intencional e diretivo.


Tecendo em Reverso- Muitas vezes temos a ideia de creche como um depósito de crianças com profissionais mal preparados “tomando” conta dos bebês. Como trabalhar para modificar a visão assistencialista que vai se solidificando sobre estas instituições?

ANA CAROLINA GALVÃO MARSIGLIA – Em articulação ao respondido na questão anterior, essas ideias são muito presentes e estão bastante atualizadas pelas pedagogias do “aprender a aprender” (nos termos do professor Newton Duarte). A mudança dessa visão depende da formação dos professores por uma perspectiva contra-hegemônica, que valorize o ato de ensinar e que compreenda o papel do ensino, desde os pequenos. Mas não nos esqueçamos que, se o interesse pela profissão docente em geral não é mais o mesmo de outras épocas, em função das precárias condições de trabalho e salariais, no caso da educação infantil esse assistencialismo agrava ainda mais o caso, posto que se espera muito pouco do exercício profissional desses docentes. Como já afirmei, basta “gostar de criança”, o que cria condições de trabalho e salariais ainda menos vantajosas. Isso significa que ter bons profissionais na educação infantil passa, para além da formação, pelo incentivo à carreira.


Tecendo em Reverso - Sabe-se que a literatura contribui muito para a formação humana. Em que medida os livros adotados por escolas para as crianças da educação infantil podem influenciar positiva ou negativamente no processo de formar leitores?

ANA CAROLINA GALVÃO MARSIGLIA – Não apenas os livros, mas os brinquedos, as músicas, os jogos, enfim, todos os materiais exercem influência positiva ou negativa na formação das crianças. Assim, livros de boa qualidade são essenciais para a formação de bons leitores, assim como todos os outros materiais terão relevância na formação integral dos sujeitos. A questão é: o que é um bom livro/brinquedo/jogo/música etc.? Reconhecer um material de qualidade implica conhecer as características do desenvolvimento das crianças, em suas diferentes idades e particularidades, de forma a oferecer a elas os recursos mais elaborados para colaborar em seu processo de humanização. Além disso, é preciso tomar como critério de seleção, aquilo que Dermeval Saviani define como “clássico”: o que tem validade histórica mesmo fora de seu tempo; carrega em si uma concepção de mundo; é modelar em suas qualidades – as mais diversas: riqueza conceitual, sofisticação linguística, propriedades estéticas etc.


Tecendo em Reverso - Como prática social e a prática educativa coadunam-se dentro da perspectiva histórico-crítica?

ANA CAROLINA GALVÃO MARSIGLIA – A prática social é ponto de partida e ponto de chegada da prática educativa. Isso porque a prática educativa é uma modalidade de prática social. Logo, ela deve desenvolver-se de modo a enriquecer, alterar, transformar a prática social. Para atingir esse objetivo, é preciso que a prática educativa atue a partir (ponto de partida) dos problemas da prática social, instrumentalizando os indivíduos para que ascendam a formas de pensamento (teoria) mais elaboradas, que se efetivem (ponto de chegada) na vida das pessoas (prática). A questão é que as práticas pedagógicas dominantes (de cunho pós-moderno), por tomarem a vida cotidiana como pauta da educação escolar, tem ponto de partida (a prática social), mas não tem ponto de chegada como algo qualitativamente superior. Nessas pedagogias, temos, como costumo chamar, de ponto de “ficada” em lugar do ponto de chegada. Ora, isso acontece porque a escola de base teórica pós-moderna, parte do cotidiano e fica nele, pois não avança em direção à vida não cotidiana (arte, filosofia, ciência, política).


Tecendo em Reverso - Para o mês de outubro você está organizando em Vitória (ES) o seminário “Dermeval Saviani e a Educação Brasileira”. Como surgiu a ideia do evento e qual a importância deste educador para o povo brasileiro?

ANA CAROLINA GALVÃO MARSIGLIA – Durante meus estudos de pós-doutorado, no ano de 2015, ao refazer o percurso das obras da pedagogia histórico-crítica e da trajetória pessoal de seu principal formulador, o professor Dermeval Saviani, me deparei com o ano de início de sua carreira docente (1966). Considerei então que precisávamos nos organizar para realização de uma merecida homenagem a ele. A trajetória de Saviani se revela comprometida com a educação se expressa em sua atuação teórico-prática no campo educacional. A quantidade e a qualidade de seus escritos nos comprovam que suas ideias são oportunas e contemporâneas, constituindo-se contribuição ímpar para a educação brasileira. Sua atuação institucional em diferentes instâncias em muito alavancou a educação brasileira. Colocando sua competência de trabalho à disposição da educação, Saviani realiza um trabalho rigoroso, cuidadoso, sério e agrega a isso sua capacidade de dialogar, conviver e respeitar a todos, de maneira aberta e sensível. A isso se deve parte da penetração que ele consegue ter, pois viabiliza que o outro se desenvolva, mesmo que em direção diferente da sua, promovendo o debate franco e fraterno entre pares. Sua postura ética, sua contribuição acadêmica, seja na formação de quadros ou por meio de suas inúmeras publicações que expressam sua postura de militante intelectual, são um dos melhores e maiores testemunhos da luta pela educação básica e superior hoje no país, sendo justa a homenagem para ele organizada em seus 50 anos de carreira.





sexta-feira, 13 de maio de 2016

Maria do Carmo Leite

Nos arredores do Capitólio as meninas cantam pelas ruas. Ouvimos também os sons confusos de idiomas inimagináveis.Nas praças os chamados “ricachones” europeus alugam os carros antigos para passearem por Havana. Muitos vão à ilha, mas poucos a conhecem com profundidade.
“Nuestra América” tão bem definida por José Martí abriga um país de lutas implacáveis contra o imperialismo.
No último dia 27 de março, após a visita do presidente Barack Obama à Cuba, reafirmando um processo de reabertura política, o líder Fidel Castro assinalou em seu artigo El Hermano Obama publicado no jornal Granma:

“Ninguém acalente a ilusão de que o povo deste nobre e abnegado país renunciará à glória e os direitos e à riqueza espiritual que ganhou com o desenvolvimento da educação, a ciência e a cultura”.

Fidel está coberto de razão. A educação cubana encontra-se entre as melhores do mundo.
A professora da Universidade Católica de Santos (SP): Maria do Carmo Leite tem dedicado suas pesquisas acadêmicas ao processo educativo em Cuba. Ao longo dos anos viajou muitas vezes até Havana para solidificar um amplo estudo interessado neste modelo que chama atenção pelas iniciativas bem sucedidas.

Confiram a entrevista:

                                                                                                    Foto: Arquivo pessoal da pesquisadora.


Tecendo em Reverso - José Martí é uma grande referência intelectual para o povo cubano. De que forma a obra deste pensador influencia ainda hoje a educação em Cuba?

MARIA LEITE - O ideário pedagógico de Martí ainda provoca aguçadas reflexões sobre a formação de todos os valores societários da ilha. Acredito que a Ilha nunca poderá abandonar o pensamento martiano. A pedagogia cubana, por mais breve e conciso seu estudo, não pode ser escrita sem referência ao extraordinário papel desempenhado pelo “apóstolo” nacional de Cuba.
Martí foi um homem de firmeza na expressão, de consciência anticolonialista e um alto sentido de solidariedade humana. O jornalismo, conjugado com a intensa atividade política, ocupou grande parte de suas atividades. Como professor, Martí ganhou a vida nas fases mais difíceis, mas não foi pedagogo no sentido estrito do termo, pois sua profissão foi a de advogado, ainda que licenciado em Filosofia e Letras. Apesar do restrito tempo, em seus 42 anos de vida, dedicados ao exercício da docência, os temas educacionais ocupam significativo espaço no conjunto da obra de Martí. O fato do ideário ético-político martiano, impregnado de humanismo pedagógico, privilegiar os valores tornou-se evidente, a partir 1889, quando da publicação da La Edad de Oro, revista voltada para crianças do continente latino-americano ameaçadas pela progressiva perda de sua identidade cultural. Na concepção de Martí, era um fato grave a Educação latino-americana seguir os padrões ou modelos dos sistemas europeus e norte-americanos, desvinculados das realidades socioeconômicas em que se aplicavam. A tradição pedagógica vinculada aos próceres da independência, não apenas de Martí, mas de Félix Varela, Enrique Varona e muitos outros, contribui para uma concepção relativamente autônoma da educação na ilha, com claros reflexos no cotidiano das escolas. Na ordem política, as diferentes etapas da revolução educacional, que se iniciou após 1959, valorizam um legado pedagógico autóctone, o qual contribuiu para a revindicação do trabalho docente em Cuba em um contexto distinto dos postulados neoliberais, oposto do mundo do trabalho que vem do “modelo de competências”, com todas as contradições e o fatalismo de disputas competitivas que ele suscita e, consequentemente,  a constatação de que ser competente representa, também, saber transgredir e até corromper.


Tecendo em Reverso - Como o sistema educacional cubano agrega escola, família e organizações sociais?

MARIA LEITE - A importância destinada aos conselhos de direção, de escola e de grado e a forma sistemática como eles atuam constituem um avanço nos projetos da escola cubana. Uma das ponderações relacionadas ao que Zeichner chama ilusão da reflexão é a insistência em que os professores podem pensar sozinhos sobre seu trabalho. Uma grande parte do discurso sobre o ensino reflexivo faz pouco sentido, pois fala-se pouco da reflexão enquanto prática social, através da qual grupos de professores podem apoiar e sustentar o crescimento uns dos outros. De acordo com os Informe de Seguimiento de la Educación para Todos en el Mundo da Unesco um dos pontos fortes da educação em Cuba é o mecanismo para compartir experiências. Concordo com tais conclusões, na medida em que os debates promovidos nos coletivos das escolas e nos órgãos de direção, contam com o envolvimento significativo dos atores do processo, mobilizados em razão da urgência e da extensão dos problemas. No modelo projetado para a escola em Cuba, as relações entre os estudantes, os coletivos de pioneiros, os claustros, as organizações de massas, o conselho de escola e a comunidade devem contribuir para formar nos alunos uma cultura de diálogo e debate, que favoreça atitudes positivas a respeito das relações interpessoais e das tarefas revolucionárias das novas gerações, como se espera numa democracia participativa.
 O conselho de direção é composto pelo diretor, secretário docente, chefes de grado, guia base, secretários do núcleo do partido, comitê de base da União de Jovens Comunistas, seção sindical, presidente de conselho de pioneiros, representante da Federação dos Estudantes Universitários, médico escolar, subdiretor docente, administrador e subdiretor do internato e de produção, quando houver. A frequência de reunião desse conselho é mensal, com a função de elaborar o diagnóstico integral da escola e da comunidade, promover o trabalho político e ideológico, avaliar o cumprimento dos fins e objetivos de cada etapa do curso escolar, adotar estratégias elegendo prioridades como critério, determinar causas e responsáveis por problemas, elaborar os objetivos de trabalho para cada etapa, planejar o trabalho docente, preparar as atividades diferenciadas para atender aos professores e alunos, planificar treinamentos metodológicos  conjuntos e inspeções, programar os temas de discussão no conselho técnico, no claustro e no conselho de escola e, finalmente, atender e estimular seus quadros de trabalhadores.
O conselho técnico é presidido e dirigido pelo diretor da escola em integração com os chefes de grado, secretário docente, guia base e bibliotecária. Nesse conselho, concretiza-se o planejamento das ações preparadas pelo conselho de direção. Sua frequência é mensal, com as funções de planificar e desenvolver atividades metodológicas para cada grado em razão das necessidades do coletivo pedagógico, preparar estratégias com base no diagnóstico e prognóstico de desenvolvimento dos alunos, analisar os resultados das inspeções realizadas durante a etapa, coordenar e aprovar as práticas de laboratórios concebidas no planejamento do processo educativo e no trabalho da biblioteca escolar, por em prática os métodos propostos nas atividades e analisar os resultados da avaliação do desenvolvimento do processo docente.
O conselho de grado é dirigido pelo chefe de grado e integrado por todos os professores, os trabalhadores sociais e os instrutores de arte. Nessa instância são controladas as ações político-ideológicas e o desenvolvimento do processo pedagógico dos grados.  Os encontros são semanais, com duração de quatro horas. Suas funções são discutir o processo de entrega pedagógica e o aperfeiçoamento do expediente acumulativo do escolar, definir as estratégias de atenção à diversidade entre os alunos, elaborar os projetos de cunho metodológico, analisar o cumprimento dos objetivos de cada grado, propor meios para alcançar a interdisciplinaridade, projetar as linhas de trabalho científico (investigação e comunicação de resultados), coordenar os eventos da escola, viabilizar ações de entrosamento entre professores, bibliotecários, técnicos de laboratório e oficinas, ponderar sobre os resultados da avaliação do pessoal docente e, finalmente, planejar estratégias de atividades com as famílias e com a comunidade.
O conselho de escola constitui a esfera encarregada de promover a participação efetiva da família. Esse órgão deve elaborar projetos educativos, bem como acompanhar sua execução. Os encontros são mensais e suas funções são incentivar os pais a integrar  múltiplas atividades promovidas pela escola, analisar a evolução dos alunos com dificuldades, incorporar a comunidade ao trabalho de prevenção com menores que apresentam problemas de disciplina e aqueles que provêm de lares em desvantagem social ou situação de risco, favorecer o desenvolvimento psicológico e a saúde da família mediante a escola de pais, organizando palestras, debates e outras modalidades de orientação, contribuir no desenvolvimento do currículo escolar, além de valorar as opções pertinentes à continuidade de estudos dos alunos.
O claustro é a instância presidida pelo diretor, com a participação de todos os professores do centro, mais os convidados representantes das organizações, incluindo as estudantis. Os encontros desenrolam-se três vezes, no mínimo, em um ano. Suas funções são analisar os resultados dos indicadores de eficiência do centro e sua comparação com iguais etapas de outros cursos, discutir coletivamente as estratégias que propiciem o sucesso das aspirações educativas na escola.

  
Tecendo em Reverso - Em quais circunstâncias deu-se seu percurso metodológico em relação aos estudos sobre a escola secundária cubana?

MARIA LEITE - A principal pesquisa de campo que realizei na Ilha, como aluna do mestrado em Educação, entre 2003 e 2006, objetivou investigar o processo de formação do professor generalista integral – o PGI – na educação secundária básica em Cuba, destinada aos alunos, entre 12 e 14 anos, dos 7°, 8° e 9° grados, dentro do projeto em curso no sistema cubano de ensino, a partir do ano de 2001. A investigação buscou repensar, cada vez mais, que o locus de discussão dos saberes constituintes da docência e das especificidades da ação educativa a ser privilegiado é a própria escola, além de contribuir para o entendimento de novos vínculos entre o trabalho e a educação. As reflexões apresentadas ponderaram sobre a gama de possibilidades decorrentes do ato de deslocar a formação de professores da universidade para as salas de aula da educação básica. As causas que induziram as mudanças foram desencadeadas no momento histórico, o “Período Especial”, encetado em Cuba no ano de 1991, com a queda dos regimes socialistas no Leste Europeu. Até hoje, em 2016, as transformações no campo político-social na Ilha ainda estão influenciadas por inúmeros fatos recentes, sem um contexto sedimentado que permita alusões conclusivas.
Meu primeiro contato com o Sistema Nacional de Ensino em Cuba reporta-se à década de 80, quando visitei as Cidades Escolares “Libertad”, em Havana, e “26 de Julio”, em Santiago. A participação em inúmeros eventos educacionais realizados na Ilha, em diversas províncias do país, propiciou-me o fortalecimento de elos com a educação cubana e o adentrar à compreensão das situações vivenciadas na ilha. Da frequência aos institutos superiores pedagógicos – os ISPs – e às escolas extraí significativos elementos. Entretanto, o contato com os maestros, as famílias e as organizações de massa, em diversas viagens de retorno a esse país, possibilitou-me formular caminhos para a construção de uma postura crítica em relação aos processos educacionais, tanto em Cuba como no Brasil. O percurso metodológico fundamentou-se em uma abordagem qualitativa do tipo etnográfico. O início da análise documental alicerçou-se em relatórios científicos, elaborados pelo Instituto Central de Ciências Pedagógicas de Cuba.


Tecendo em Reverso - Nos debates mundiais sobre educação, vemos em Cuba uma espécie de paradigma positivo para os outros países. O que diferencia esta orientação educativa das demais?

MARIA LEITE - Acredito que o maior diferencial em relação a distintas reformas, realizadas em outros países, é a constância nos investimentos e a forte determinação política que o Estado imprime à educação. A formação do professor como militante político tem requerido, além dos saberes docentes, o preparo na qualidade de transmissor dos princípios basilares da Revolução. O professor é visto pela sociedade como um soldado da independência política e econômica do país.
O que me parece significativo na experiência em Cuba é a preocupação com o envolvimento dos especialistas das universidades pedagógicas no plano metodológico e teórico, e a sua inserção na dinâmica diária dos centros educativos. Outra questão considerável é o cuidado em derrubar as fronteiras em torno das pesquisas realizadas, que devem apresentar uma linguagem direta e compreensível aos maestros em formação, principalmente em seus itens conclusivos, nos quais se arrolam as recomendações decorrentes dos estudos realizados, evitando academicismos exagerados e desnecessários.  A preocupação com a pessoa do maestro é indissolúvel nas políticas de melhoria das escolas como espaços concretos.
A ambiguidade das reformas em curso no mundo é sintetizada pela tensão entre o “barato” e o “melhor”, na qual a lógica do mercado, em muitos casos é a única levada em consideração. Creio existir um consenso que não se faz boa educação e nenhum país pode oferecer aos seus cidadãos serviços sociais razoáveis sem uma opção clara pela garantia dos investimentos que permitam a sua oferta pública.  Cuba situa-se no grupo de alto rendimento, apresentando elevado índice para o produto nacional bruto, aplicado na educação, juntamente com a Finlândia, país industrializado com um sistema educativo de sólida tradição.


Tecendo em Reverso - No que diz respeito à formação do professor, também encontram-se por estas terras dificuldades imensas oriundas, principalmente de planos advindos dos governos que vão mudando ao sabor de cada nova gestão e, sempre coadunados aos ditames internacionais. Como se dá a formação dos docentes em Cuba e, em que ela se diferencia da formação dos professores brasileiros?

MARIA LEITE - O processo educativo em Cuba não pode ser entendido sem o vínculo com as empreitadas históricas, que cunharam um imaginário de vertentes relativo às lutas de liberação, desde a época colonial. O caráter cubano emergiu de uma “cultura de resistência”, consolidada nas lutas, ao longo de trinta anos do século XIX, nas quais pereceram quatrocentos mil cubanos, ou seja, cerca de um terço da população da ilha na época. A Campanha Nacional de Alfabetização de 1961 conjurou dialeticamente fatores sociais que permaneceram dispersos durante a primeira metade do século passado, contribuindo para que o fazer educativo assumisse uma dimensão político-social e o ensino fosse convertido em instrumento de uma cultura participativa, motivador de constantes reflexões acerca dos problemas de Cuba e dos de âmbito internacional, que tendem a afetar a vida do país.
 A visão retrospectiva da formação docente em caráter emergencial, nos diferentes contextos que evoluem imbricados ao processo político-social do país, afasta as transformações projetadas para a escola cubana do perfil das mudanças com base em formulações que partem do zero, sem recuperar a experiência e as pesquisas disponíveis, desconsiderando as condições reais e específicas de implementação. Ao movimento global, pautado pela inauguração de novos projetos a cada gestão, que muitos denominam “onda reformista”, pode ser debitado o desperdício de importantes recursos, uma vez que a descontinuidade ignora o esforço empreendido pelos coletivos escolares, o levantamento de dados e a análise de relações do saber historicamente construído. Muitas das reformas pretendidas não chegam às salas de aula ou não alteram em profundidade as suas práticas cotidianas. As chamadas inovações são introduzidas, sem uma avaliação dos erros e avanços das lições que poderiam ser extraídas dos programas que “caíram da moda”. Sem visão retrospectiva os modelos procuram soluções rápidas e que não armazenem dividendos para governos com mandatos já concluídos. As reformas movem-se no imediatismo, sem sobrevida garantida em futuras administrações.
No Brasil, do ponto de vista do professor, os ciclos e a sistemática de promoção dos alunos apareceram como forma de uma espécie de retirada de seu poder e um acuamento do controle sobre o processo de trabalho. Dessa forma, prolifera até hoje, em minha opinião, a ideia de que professor já não tem que se preocupar com os resultados de aprendizagem dos alunos, pois o sistema quer que ele “empurre o aluno para frente a qualquer custo”. Essa é uma face oposta ao que ocorre na escola cubana.  Dessa maneira, ocorre no Brasil uma espécie de  desresponsabilização pelo processo de ensino.
Entretanto em meio aos caminhos que tem sido construídos e às soluções propostas no modelo em Cuba, existem dilemas e tensões difíceis de resolver, inscritos na problemática geral do país, sobretudo no conflito entre a lógica da emancipação e da regulação. A possibilidade de participação na tomada de decisões ainda gera fortes barreiras nos professores, no pessoal de direção e nos próprios estudantes. A resistência a muitas mudanças que ocorrem atualmente não é mais que uma expressão do temor e da insegurança que podem experimentar as pessoas diante da autonomia para a qual não estão suficientemente preparadas, habituadas, por longos anos, a formas de trabalho que asfixiavam suas potencialidades para a criação e a inovação pedagógica.
Contudo, as experiências educativas são próprias de cada lugar e não é um processo simples transferir inovações. Quero salientar o aspecto fundamental propício à Educação cubana – as raízes de reflexão dialética fincadas nas circunstâncias históricas locais –, o que possibilita abarcar com mais facilidade as incoerências dos modelos anteriores. Os estudos indicam que há uma atenção voltada aos possíveis desacertos e à consciência crítica de repará-los com prontidão. As conclusões, portanto, acumuladas em retrocessos e avanços, aliadas ao resgate das experiências coletivas no campo educacional, desde a década de 60, representam um fator decisivo na efetividade das transformações. O que foi possível inferir, deste processo de investigação, é que os institutos superiores pedagógicos em Cuba criaram um caldo de práticas, acumuladas ao longo de quase 50 anos na formação de professores, capaz de trabalhar os problemas de forma abrangente e com a urgência requerida pela complexidade do processo histórico cubano.












terça-feira, 3 de maio de 2016

Márcia Tait Lima

Na introdução de As Veias Abertas Da América Latina o escritor Eduardo Galeano faz o seguinte apontamento: “ É a América Latina, a região das veias abertas. Desde o descobrimento até os nossos dias, tudo se transformou em capital europeu ou , mais tarde, norte-americano, e como tal tem-se acumulado e se acumula até hoje nos distantes centros de poder”.
E é nesse banho de sangue que vamos resistindo aos sucessivos golpes durante uma história que acumula exploração e luta.
 Elas dizem não! Mulheres camponesas e a resistência aos cultivos transgênicos é o mais recente trabalho da pesquisadora Márcia Tait Lima. O livro publicado pela editora Librum mostra o enfrentamento das mulheres camponesas na América Latina contra o cultivo de transgênicos.
Doutora em Política Científica e Tecnológica (DPCT/Unicamp) Márcia também é comunicadora Social formada pela Universidade Estadual Paulista Unesp com especialização em Jornalismo Científico pelo Labjor/Unicamp. Cursou o mestrado em Política Científica e Tecnológica (DPCT/Unicamp) e outras especializações entre os anos de 2008-2014, entre as quais: Teoria Feminista pela Universidade Complutense de Madri, Tecnologia Social e Economia Solidária (Unicamp).
Conversamos com a pesquisadora sobre seu livro:

                                                                    Foto: Arquivo pessoal da pesquisadora.


Tecendo em Reverso – O trabalho “Elas dizem não! Mulheres camponesas e a resistência aos cultivos transgênicos” se deu sob quais circunstâncias no que se refere às expectativas da pesquisadora Márcia Tait?


MÁRCIA TAIT LIMA – As questões de pesquisa que deram origem ao trabalho de doutorado e ao livro Elas dizem não! Mulheres camponesas e a resistência aos cultivos transgênicos foram sendo formuladas ainda durante a pesquisa de mestrado (também publicada em livro, Editora Annablume, 2011 http://folhashop.folha.uol.com.br/tecnociencia-e-cientistas-cientificismo-e-controversias-na-politica-de-biosseguranca-brasileira-marcia-maria-tait-lima-8539103273.html#rmcl) quando me aprofundei no universo dos conflitos sobre as políticas e regulamentações envolvendo os cultivos transgênicos no Brasil. Essa pesquisa voltou-se a analisar a participação de pesquisadores brasileiros na formulação das políticas de biossegurança e seus discursos sobre os transgênicos. Já no final deste trabalho indico a necessidade de se ampliar e“politizar” o entendimento do discurso tecnocientífico relacionado aos transgênicos. Ao longo do trabalho são colocadas algumas formas de desqualificações dos discursos críticos aos cultivos transgênicos dentro e fora da academia e a falta de participação de determinados grupos, como os movimentos sociais nas decisões políticas sobre liberação e risco. Assim, de certo modo, apesar de pesquisas bem diferentes do ponto de vista de autores mobilizados e metodologia, o estudo e o livro anterior e o atual sobre as ações coletivas de mulheres camponesas contra transgênicos são complementares e surgem de um mesmo interesse de pesquisa de propor uma leitura crítica da tecnociência e das novas biotecnologias e os cultivos transgênicos, trabalhando com discursos, epistemologias e práticas contra-hegemônicas e que sofreram ataques constantes e desqualificação que imputaram um local de não racionalidade e marginalidade aos discursos críticos.


Tecendo em Reverso – No seu livro há uma crítica ao processo de privatização dos sistemas agroalimentares. Como se dá o enfrentamento das camponesas em relação a tal situação? Tratando-se de abordagens mobilizadoras. Em que circunstância ocorre a atuação das mulheres nos movimentos sociais da América Latina?


MÁRCIA TAIT LIMA – Nos países em desenvolvimento, principalmente na América Latina, América Central e Índia, as mulheres camponesas ou trabalhadoras e agricultoras ocupam uma posição de destaque na produção de alimentos para subsistência de suas famílias e também de suas comunidades e também na preservação dos bens comuns (biodiversidade, solo, água). A produção voltada para o comércio, agricultura para venda (commodities) segue uma lógica distinta da lógica de produção da agricultura para consumo direto, familiar e local/regional (alimentos em natura e pouco processados). Neste segundo tipo de agricultura, as mulheres têm contribuído fortemente, embora homens e mulheres participem de ambas as formas de trabalho rural e da produção de alimentos e, portanto, façam parte dos sistemas agroalimentares. O que discuto no livro é justamente como as mulheres vêm atuando na prática da resistência à homogeneização e à privatização das culturas alimentares e sistemas alimentares. No Brasil e Argentina esta resistência se dá pela prática familiar da agricultura camponesa, mas também na associação em movimentos sociais, organizações e cooperativas mistas e exclusivas de mulheres, que quando atuam coletivamente colocam questões diversas como: a própria produção e prioridade da alimentação familiar, local, diversa e livre de contaminações; as desigualdades e violência de gênero persistentes no universo rural; os impactos da monocultura e privatização de sementes para as famílias camponesas e produção de alimentos, entres outras. Esta mobilização/articulação de mulheres em movimentos de trabalhadoras rurais e camponesas não é recente, remonta ao final da década de 70 e início de 80 e aos movimentos por direitos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais e processos de redemocratização nos diversos países da América Latina. Porém, durante os finais dos anos 90 primeira década de 2000 os movimentos de mulheres foram crescendo em protagonismo na luta por soberania alimentar e contra os cultivos e sementes geneticamente modificadas.


Tecendo em Reverso – Tratando-se de abordagens mobilizadoras. O que une e separa as camponesas brasileiras e argentinas no que diz respeito aos temas relativos à produção de alimentos?


MÁRCIA TAIT LIMA – Na minha pesquisa e livro busco destacar principalmente as convergências entre as questões, discursos e as ações dos movimentos e grupos de mulheres no Brasil e Argentina. Porque acredito que as convergências são mais significativas que as distinções. Em várias oportunidades de leituras e participação em eventos em outros países, como Bolívia e Equador, também notei mais semelhanças que diferenças, sem desconsiderar, claro, que existem diferenças culturais e de contexto sociopolítico, por exemplo, na Bolívia e Equador a questão camponesa está muito mais vinculada à questão indígena. Neste sentido mais de refletir a partir das convergências e o que aproxima os movimentos de mulheres e participação de mulheres em movimentos e organizações no Brasil e Argentina, poderia destacar: uma forte crítica à mercantilização da agricultura ou ao modus operandi da agricultura industrial e aos impactos negativos para as famílias de pequenos agricultores e para as finalidades e formas e produção de alimentos; uma crítica à diminuição da autonomia, empobrecimento e a crescente dependência de insumos químicos e agrotóxicos na agricultura familiar e camponesa; expulsão do campo e diminuição das pequenas áreas de produção agrícola e cultivos voltados para alimentação em suas regiões e países e não para exportação; crescente empobrecimento e piora das condições de vida das mulheres e famílias camponesas; a agricultura para o alimento e o alimento como medicamento. Essa aproximação na crítica também dialoga com formas de resistência e propostas semelhantes, como feiras de trocas de sementes crioulas, feiras de produtos da agricultura familiar a agroecológica, cooperativas e pequenas associações que trabalham com beneficiamento de alimentos (pães, doces, geleias, chás, frutos secos) e artesanato; formação e solidariedade entre mulheres sobre gênero e feminismo, direitos reprodutivos e saúde, etc.


Tecendo em Reverso – No atual momento político em que infelizmente a mídia irresponsavelmente lança no país ódio e preconceito em relação às mulheres envolvidas na política. Qual reflexão você apontaria para a discussão sobre gênero e consciência de classe?


MÁRCIA TAIT LIMA – Quando lemos ou conversamos com mulheres que participaram nos processos de lutas das classes populares e da esquerda no Brasil e América Latina notamos uma importante similaridade: a formação de movimentos autônomos de mulheres motivadas por um desrespeito à participação política feminina e desconsideração de suas demandas e da própria importância das questões envolvendo a desigualdade de gênero. Existem várias colocações sobre das mulheres militantes sobre como o tema de gênero era referido como sendo uma “lutinha” ou “luta menor” dentro dos movimentos e partidos de esquerda, ou ainda que, primeiro se deveria preocupar com as questões de classe e a superação do capitalismo para depois ou mesmo de forma natural se dissolverem as questões feministas.
No passado e no presente, não apenas nos movimentos de direita, mas também dentro de grupo de esquerda e “progressistas” ainda não existe um entendimento partilhado (pelo menos não de forma majoritária) de que capitalismo e patriarcado são duas faces da mesma moeda, que devem, portanto, ser combatidos juntos - não é possível, honesto e/ou realista o estabelecimento de prioridades. Não reconhecer a exploração e subvalorização do trabalho socialmente designado às mulheres ou feminino - desde trabalho doméstico e de cuidado familiar até nas carreiras ocupadas mais amplamente por mulheres, como na educação, saúde, serviço social - como parte da “luta de classes” é uma “contradição ainda não superada” nas esquerdas, nos meios políticos e em muitas políticas públicas. Esta impossibilidade de separação se mostra bastante clara, por exemplo, numa leitura feminista do aclamado filme “Que horas ela volta”, onde se escancara a exploração de classes, mas também uma exploração de “interseccional” que envolve gênero e raça/etnia, um tipo de desigualdade/discriminação tão conhecida quanto persistentemente “apagada” pela sociedade brasileira: da mulher, pobre e nordestina. São muitas relações possíveis de serem estabelecidas a partir deste filme do ponto de vista feminista, dentre elas, o “ciclo de exploração” das tarefas domésticas e de cuidado que afetam mulheres de todas as classes (faltam políticas públicas e abordagens sociais sérias sobre quem cuida e como das crianças, adolescentes, idosos, doentes), mas principalmente, às mulheres trabalhadoras das classes populares, que não educam e cuidam de seus filhos para cuidarem dos filhos da classe média e alta e “serem quase como parte da família” de outras famílias que não as suas.
De positivo, este contexto recente também aponta justamente para o chamado de “re-florescimento” do feminismo na última década. As mulheres cada vez mais se mobilizam em distintos movimentos feministas, com ênfase em temas diferentes (livre exercício da sexualidade; humanização do parto e medicalização feminina; assédio e machismo nos espaços de trabalho e públicos; desigualdades no trabalho; maior espaço na política etc.), mas todos têm como base a não aceitação da desigualdade, exploração e violência de gênero e, diria também, um “re-florescimento” de uma “sororidade” ou sentido de empatia e união entre mulheres e, porque não dizer, entre mulheres e homens que também defendem as causas feministas. 
Não se pode deixar de notar que muitas manifestações reagem a acontecimentos que reforçam traços de uma sociedade ainda machista e sexista (como coloca em sua pergunta), mas estas reações antes não eram tão vocalizadas ou visíveis e agora são! Não acredito que antes já vivemos períodos melhores em relação ao machismo e sexismo, muito pelo contrário, mas agora isto se escancara e são vistas as rebeldias e resistência, o Não! das mulheres (e homens) como o das camponesas deste livro.  E também vemos claramente o inconformismo, por vezes expresso em reações violentas de homens e também mulheres que não aceitam a igualdade e liberdade para os gêneros e os seres humanos. A “viralização” de posts de resistência/reação a partir da reportagem publicada pela revista Veja “Bela, recatada e do lar”, referente à Marcela Temer, mulher do vice-presidente da república, ilustra bem este espaço de conflito sempre latente e agora cada vez mais escancarado entre setores, grupos, pessoas conservadoras e machistas, que querem impor um modelo de mulher e feminino, e outros inúmeros lados, transbordando e resistindo, centenas, milhares de mulheres reais que não aceitam esta imposição.  Como dizem as mulheres camponesas nos chamados a “companherada”: Lutar! Quando? Todos os dias! Quando mesmo? Todos os dias! (e na toada da Marcha Mundial das Mulheres) – Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres!