Por Juliana Gobbe
O blogue Tecendo em
Reverso traz uma entrevista com a socióloga Azilde Andreotti, doutora em
Educação pela Unicamp, também pesquisadora vinculada ao grupo HISTEDBR (
História, Sociedade e Educação no Brasil). A socióloga atualmente é responsável
pelo Acervo Histórico do Livro Escolar (AHLE) da Biblioteca Monteiro Lobato –
Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo.
Recentemente lançou pela
Paco Editorial o Livro: “O Jornal A voz
da infância” (1936-1950) Educação e Cultura na Modernidade Paulistana e é sobre
esse trabalho que a autora conversou conosco.
Foto: Arquivo pessoal da pesquisadora.
Tecendo em Reverso – O que a levou a pesquisar “ O
Jornal A voz da infância (1936 -1950)”?
AZILDE ANDREOTTI -
Eu conheci o jornal através de um trabalho
de organização do Acervo Memória da Biblioteca Monteiro Lobato. Essa
Biblioteca foi criada em 1936, compondo o projeto de políticas culturais de São
Paulo, com Mário de Andrade como diretor do Departamento de Cultura e mantinha
registros e documentos de sua trajetória espalhados, desorganizados e mal
conservados. Nesse acervo encontrei o jornal “A Voz da Infância” que logo me
chamou a atenção pelo conteúdo, periodicidade, pela participação das crianças e
jovens em todo o processo de sua elaboração como um projeto educativo da
Biblioteca. A minha pesquisa se voltou para as ideias que nortearam não só a criação
do jornal, mas também seus conteúdos. Essa é uma das possibilidades entre
outras que esse jornal apresenta como fonte de investigação.
Tecendo em Reverso – De que forma as diretrizes políticas
embasaram a composição do jornal pelas crianças e adolescentes na Biblioteca
Infantil Municipal nas décadas pesquisadas?
AZILDE ANDREOTTI – Se pensarmos em política cultural e
educativa, a própria criação de uma Biblioteca Infantil pública na década de
1930 demonstra um projeto de atuação mais abrangente em relação à criança, que
poderíamos chamar de moderna, na época.
Afinal, as bibliotecas eram vistas como lugar de silêncio, de reflexão,
voltadas principalmente ao público adulto. Sem dúvida a iniciativa de
elaboração do jornal propiciava a permanência da criança e do jovem na
Biblioteca, além de incentivá-los a participar de um projeto organizado,
coletivo, e educativo.
Tecendo em Reverso - Como a cidade de São Paulo foi
retratada pelo jornal?
AZILDE ANDREOTTI – Eis aí um dos aspectos curiosos do
jornal, pois além da descrição de espaços urbanos como praças e ruas da época
através de crônicas, transparece, em vários momentos, um sentimento de
enaltecimento de São Paulo por conta da Revolução Constitucionalista, muito
próxima de 1936, quando foi editado o primeiro número do jornal. Mas esse
sentimento vai se diluindo com o tempo e outro aparece, o orgulho do progresso,
das avenidas e dos prédios que surgiam na cidade.
Tecendo em Reverso - Em seu
livro lemos: “As propostas de trabalho da Biblioteca atendiam a necessidade de
despertar o interesse da criança indicando a semelhança com os princípios da
Escola Nova, considerados processos mais criativos e menos rígidos do que as
práticas educacionais tradicionais”. Até que ponto o escolanovismo norteou as
atividades da Biblioteca?
AZILDE ANDREOTTI – As ideias
do movimento da Escola Nova se fortaleceram nos anos de 1930 e a Biblioteca foi
dirigida, desde a sua instalação, por Lenyra Fraccaroli, normalista da Escola
Caetano de Campos, influenciada por esse movimento. Ao mesmo tempo boa parte
das crianças que frequentavam a Biblioteca e compunham o jornal estudavam em
escolas particulares, onde essas ideias se lançaram primeiramente. A
criatividade, a iniciativa e a participação em projetos eram estimulados, até
por se tratar de um espaço diferente do da escola, mas a leitura de livros era
obrigatória para que a criança pudesse ver um filme, por exemplo.
Tecendo em Reverso – De
acordo com sua pesquisa, como as crianças e jovens reproduziam as ideias da
sociedade à época?
AZILDE ANDREOTTI – A escola
foi, naquele período, importante fonte de informação dessas crianças. Muito dos
conteúdos representados no jornal traduziu essa influência e não poderia ser
diferente. Afinal, a escola ao mesmo tempo em que exerce seu papel de propagadora
de ideias, insere-se dentro de padrões sociais. Essa relação analisada como um
todo nos fornece um retrato de aspectos culturais, educativos e sociais daquele
tempo.
Foto: Divulgação
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