terça-feira, 2 de setembro de 2014

MAURO IASI

Mauro Iasi é candidato a presidente da República pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB).  Nasceu em São Paulo-SP  em 1960.  Graduou-se em HISTÓRIA  pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.   Mestre e doutor  em SOCIOLOGIA  pela  USP, exerce o cargo de  professor adjunto da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro.    Exerceu o cargo  de   presidente do Sindicato dos Docentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), de  2011 a 2013.  Publicou os  livros: O Dilema de Hamlet – O ser e o não ser da consciência (Viramundo) e o recente   As Ruas – Poemas e reflexões pedestres (ICP), dentre outros. Integra o  Comitê Central do PCB.
 Tecendo em Reverso entrevistou o político, professor e literato   Mauro Iasi,   em busca de respostas para as inquietantes perguntas e  questões arguidas pelos leitores no curso  deste blog, dentre estudantes, artistas, educadores e  escritores.  


                                                                 Foto: Divulgação



Tecendo em Reverso – O voto distrital representa um avanço com relação à democracia representativa?


MAURO IASI – Não. Para nós, do PCB, a proposta do voto distrital representa um retrocesso político. Vez por outra, os setores conservadores tiram do colete a proposta de introdução do voto distrital nas eleições proporcionais. Isto significa que cada eleitor só pode votar em candidatos inscritos para disputar a eleição num distrito, ou seja, apenas numa determinada jurisdição. Não poderiam votar num candidato domiciliado na capital ou em outra região. Hoje já existe uma grande despolitização nas eleições proporcionais, com uma tendência ao voto que privilegia os candidatos locais, os quais prometem obras, serviços e favores aos seus eleitores, deixando de lado as grandes questões nacionais e as lutas em prol de transformações sociais e políticas efetivas, na contracorrente da ordem burguesa e do domínio dos interesses capitalistas sobre a vida da população. O advento desta mudança reduziria ainda mais a possibilidade do voto politizado, de opinião, tornando minoritário o voto conscientizado, razão principal dos partidos revolucionários. Uma vez eleito, o parlamentar distrital tende a se comportar no parlamento como uma espécie de despachante da região que o elegeu e pela qual pretende se reeleger. Com a implantação do voto distrital, o debate político e ideológico dará lugar ao bairrismo e às disputas regionais.


Tecendo em Reverso – Como transformar a proposta de governo do PCB em futuro?


MAURO IASI – Queremos transformar o programa político do PCB em presente, pois é urgente reverter o quadro atual marcado pelos graves problemas com que se defrontam os trabalhadores e o conjunto da população brasileira. Estes não serão resolvidos com a manutenção e desenvolvimento do mercado e da economia capitalista. Não é mais possível pensarmos que se enfrentarão as profundas desigualdades existentes – a falta de serviços essenciais à vida humana (alimentação, moradia, transporte, educação, saúde, lazer, cultura, etc.), a barbárie em que se transformou a civilização do capital e da mercadoria, com o genocídio dos pobres, dos negros, das populações indígenas – aplicando políticas que visem ampliar o acesso aos bens materiais com o simples crescimento econômico capitalista, o que só faz aumentar a destruição da natureza e acaba concentrando ainda mais a riqueza na forma de lucros acumulados privadamente. Nossa luta é para que os trabalhadores e a imensa maioria da população brasileira participem conosco de um grande movimento em defesa do Poder Popular, dando continuidade às grandes manifestações que explodiram no Brasil em junho de 2013, revelando a enorme contrariedade do povo com as condições de vida a que está submetido, sob imposição do capitalismo. A saída para o movimento de rebeldia das massas é fazer com que esta luta assuma um caráter político, isto é, a forma de um programa e de uma ação que se apresente como uma real alternativa de poder ao domínio atual das classes proprietárias.


Tecendo em Reverso – A atual juventude brasileira pode se espelhar na práxis da juventude comunista do século XX?


MAURO IASI – Acredito que sim, no sentido de que a juventude revolucionária – e não só aquela que integrava os partidos comunistas no mundo – participou ativamente de movimentos responsáveis por grandes transformações sociais e políticas, seja na tentativa de afirmação de propostas socialistas, seja na resistência às determinações do capitalismo e às intervenções do imperialismo. A juventude esteve presente nas manifestações de massas, nas revoltas anarquistas e revoluções socialistas do século passado, participando ativamente das inúmeras lutas contrárias às injustiças e desigualdades impostas pela burguesia. Foi assim nas greves operárias do início do século XX, nas revoluções de 1917 na Rússia, em 1949 na China, em 1959 em Cuba. Resistiu o que pôde contra os regimes fascistas, apoiou os movimentos de libertação nacional na Ásia e na África nos anos 1950, esteve junto às lutas por direitos civis nos EUA, montou barricadas em Paris em 1968, foi às ruas em todas as grandes cidades do mundo para protestar contra o ataque imperialista estadunidense no Vietnam. No Brasil e em toda a América Latina, resistiu bravamente às ditaduras financiadas pelo grande capital, imolando suas vidas em nome da liberdade e do socialismo. A União da Juventude Comunista (UJC), ligada ao PCB, dá sequência hoje à luta revolucionária e internacionalista dos jovens. Contamos com ela e com toda a juventude brasileira que clama por mudanças radicais na sociedade contemporânea para o processo de construção do Poder Popular e do socialismo em nosso país.


Tecendo em Reverso - O exercício do cargo de presidente da república do Brasil pressupõe concessões às oligarquias. O PCB pretende retomar a política de aliança com a burguesia nacional?


MAURO IASI – Não concordo com a premissa colocada. A concessão às oligarquias é feita pelos partidos burgueses e por aqueles que acabaram se rendendo à forma capitalista de governo. A maneira que a burguesia encontrou historicamente foi o desenvolvimento de uma institucionalidade política na qual muitos participam – através das eleições – para que poucos governem, garantindo a dominação exercida pela minoria de proprietários. Para reverter isso não basta uma reforma política ou a engenhosidade de sistemas de representação, organização partidária e sistemas eleitorais pitorescos. Só é possível contrapor o poder da burguesia com o poder popular. A única maneira de contrapor o poder daqueles que querem manter as formas de propriedade atuais e as relações sociais de produção a elas associadas é constituir um poder capaz de enfrentá-los com a força da mobilização popular para derrotá-los, neutralizando ou destruindo seus recursos de poder. Não há a mínima chance de o PCB promover alianças com a burguesia. O PCB defende que somente a Revolução Socialista, entendida como um forte e poderoso processo de lutas populares que desemboque na construção de uma sociedade alternativa ao capitalismo e à ordem burguesa, será capaz de realmente resolver os problemas vividos pelos trabalhadores e setores populares. Por isso o PCB apresenta uma alternativa anticapitalista e socialista e lutará para que se constitua na sociedade a força política necessária à sua implementação.


Tecendo em Reverso – No seu livro: O dilema de Hamlet lemos: “...o dilema de Hamlet é o dilema da consciência militante. Vê o mundo se desmoronar e vive profundamente seu sofrimento. Quer realizar a profecia de justiça, mas se sente fraca como indivíduo diante das forças objetivas de um mundo que se apresenta de forma invencível”. Como se dá o enfrentamento da problemática da consciência no debate da contemporaneidade econômica e política?


MAURO IASI – Os capitalistas, através de todos os meios possíveis, desde as formas de exploração direta dos trabalhadores nos ambientes dedicados à produção, à difusão da ideologia dominante nos diversos espaços sociais existentes, como as escolas, igrejas, etc, passando pela manipulação aberta com o uso abusivo dos meios de comunicação, tentam neutralizar ou paralisar todo processo coletivo de tomada de consciência das classes dominadas. A tomada de consciência é a experiência que cada trabalhador individualmente e todos os trabalhadores juntos – como classe – vão construindo a partir de suas próprias lutas e suas próprias vivências. A consciência de classe se constrói todos os dias. Ninguém nasce com ela. A consciência, como o senso comum, é um campo de disputa. A militância revolucionária atua para que os trabalhadores e a população explorada pelo capital compreendam que a raiz dos seus males está no sistema capitalista, que seu inimigo principal não é o colega de trabalho, o vizinho, o motorista do ônibus, o funcionário do comércio ou o servidor da prefeitura, mas os donos dos meios que produzem a sua exploração. A criação de uma consciência socialista pressupõe uma luta, desde já, para a construção de organizações políticas autônomas, independentes e próprias da classe trabalhadora, que tomem a iniciativa nos movimentos populares e que, nos embates contra a ordem burguesa, construam uma poderosa força política unitária contraposta ao bloco dominante, formulando um programa político de transformações necessárias de caráter anticapitalista. Isto é o que chamamos de Poder Popular. E temos certeza de que este processo está em curso no Brasil. Por isso acreditamos que o socialismo não seja uma quimera, mas uma possibilidade real e, acima de tudo, uma necessidade no mundo de hoje, marcado pela barbárie capitalista.
 
 

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