Adailton Alves Teixeira é Diretor, ator, palhaço e
professor de teatro. Graduado em História pela UNICSUL; mestre em Artes - Área
de Concentração: Artes Cênicas, pelo Instituto de Artes da UNESP, com a
pesquisa sobre o território e a identidade como norte do processo de criação
para o teatro de rua. É membro fundador do grupo Buraco d`Oráculo, do Movimento
de Teatro de Rua de São Paulo, da Rede Brasileira de Teatro de Rua e do Núcleo
Brasileiro de Pesquisadores em Teatro de Rua.
Foto: Arquivo pessoal do artista.
Tecendo em Reverso - Em quais circunstâncias se deu a
criação do Buraco d’Oráculo? Qual é o referencial estético do grupo?
ADAILTON ALVES TEIXEIRA – O grupo surgiu em 1998 em um
projeto coordenado por João Carlos Andreazza, na Oficina Cultural Amácio Mazzaropi;
tratava-se da criação de um núcleo de teatro de rua, com aulas de
interpretação, expressão corporal, criação musical etc. e ao terminar uma
montagem teatral. Teve a duração de dez meses. Esses processos quase não se veem
mais...
Depois o grupo passou por outro projeto, o Ademar Guerra,
sendo orientado por Ednaldo Freire, diretor da Fraternal Cia. De Artes e
Malas-Artes. Esses dois processos são fundantes e fundamentais na história do
grupo. O primeiro mostrou a rua como possibilidade cênica e o segundo nos
aproximou da estética popular, consequentemente, de um público que não
frequentava as salas de espetáculos.
Foto: Divulgação
Tecendo em Reverso - Suas pesquisas na Unesp
direcionavam-se pelo viés do “território e a identidade como norte do processo
de criação para o teatro de rua”. Como você avalia a atuação dos coletivos
artísticos atualmente nas ruas das grandes cidades?
ADAILTON ALVES TEIXEIRA – Os coletivos de teatro de rua
são essenciais nos grandes centros urbanos e também nas pequenas e médias
cidades, por muitos motivos. Destaco alguns: a possibilidade de acesso da arte
teatral; a ressignificação dos espaços públicos abertos, o que faz com que os
cidadãos se relacionem com sua cidade de outra maneira, criando afetividade com
os locais das apresentações; nas cidades pequenas, em geral, não há edifícios
teatrais, então aí, a praça torna-se fundamental como local de encontro e das
trocas simbólicas.
Hoje, cada vez mais é preciso olharmos com atenção a
questão do território, na medida em que a própria cidade se torna uma
mercadoria, então a arte entra também na disputa de que cidade se deseja, que
se quer. E, claro, isso também acaba norteando, influenciando os processos de
criação dos grupos. Mas não tem sido fácil, na medida em que a cidade entra na
lógica mercadológica, começa a perseguição aos artistas populares e temos visto
isso ocorrer em diversas cidades grandes e pequenas, bem como em metrópoles
como Rio de Janeiro e São Paulo. A disputa pelo espaço é diária. Então,
entender o que é território na atualidade é importante tanto para quem faz
arte, quanto para aqueles que apenas se relacionam com ela, que fruem.
Foto: Divulgação
Tecendo em Reverso - Como foi concebida a “Ópera do
Trabalho”?
ADAILTON ALVES TEIXEIRA – Ópera do Trabalho é o último
espetáculo do Buraco d`Oráculo, criado em 2013, mas que vem de um processo
anterior. No grupo, um projeto acaba desencadeando no seguinte, isto é, uma
determinada pesquisa que estamos realizando, seja teórica ou estética, acaba
sempre tomando outros desdobramentos. Isso ocorreu com a Ópera do Trabalho. O
grupo vinha pesquisando a história de algumas comunidades do extremo leste da
cidade de São Paulo para a construção de outro espetáculo, isso nos levou a
questão da precarização do trabalho na contemporaneidade. Por outro lado, a música
sempre esteve presente em nossos estudos e queríamos verticalizar essa
pesquisa. Então aliamos essas duas pesquisas, ao mesmo tempo em que abrimos
espaço para outras pessoas, isto é, criamos oficinas de formação para criarmos
um espetáculo com mais pessoas além dos integrantes do grupo.
Todo o processo foi coletivo, como tem sido tudo o que temos
feito, pessoas do projeto e mesmo de fora contribuíram com criações, dicas,
conversas, críticas... É um espetáculo em que a dramaturgia está organizada
pela música, o que é um caminho novo para o grupo e, em certa medida, no teatro
de rua. A experiência de um teatro musical não é nova, já foi muito
experimentada, mas na rua, não se sabe de muitas experiências nesse sentido.
Então estamos colhendo as dores e as alegrias desse processo.
Foto: Divulgação
Tecendo em Reverso - Qual é a influência de Brecht no
teatro épico brasileiro?
ADAILTON ALVES TEIXEIRA – Embora Brecht tenha chegado ao
Brasil pela via comercial, mas uma ideia fora do lugar como tantas outras,
rapidamente ele é apropriado pelo Teatro de Arena, que começa a experimentar e
a disseminar as proposições do teatro épico. Hoje, todos os grupos utilizam
procedimentos épicos, ainda que não sejam, necessariamente, brechtianos, ou
seja, os grupos utilizam procedimentos estéticos característicos do teatro
épico estudados por Brecht e Piscator, mas não necessariamente fazem um teatro
em que a função social está em seu horizonte, isto é, nem sempre há preocupação
com o desvelamento da sociedade em que vivemos.
Quanto ao teatro de rua, este é épico por definição, na
medida em que não é possível fazer um teatro de rua fechado, sem relação direta
com o público, etc., mas isso não significa também que todo teatro de rua
desenvolva propostas cênicas preocupados com o tempo presente e nossas relações
sociais. Nesse sentido, a importância de Brecht vem no sentido de mostrar como
olharmos a sociedade, as relações sociais em que estamos todos envolvidos. A
rua, nesse sentido, ganha outra importância, pois está em um espaço, em tese,
de todos. O teatro que se coloca aí precisa ter a consciência da importância da
disputa do imaginário das pessoas que se deparam com a obra artística.
Conheça o trabalho do artista:
Juliana Gobbe
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