RESENHA: EDUCAÇÃO E ENSINO NA OBRA DE MARX E ENGLES, DE JOSÉ CLAUDINEI LOBARDI. CAMPINAS, SP: ALÍNEA, 2011. 256 P.
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Após anos de intensas pesquisas José Claudinei Lombardi publicou no ano de 2011 a obra Educação e ensino na obra de Marx e Engels. Texto derivado de sua livre docência pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (FE-UNICAMP), o livro está editado pela Alínea, na cidade de Campinas-SP. No geral, o trabalho pretende colaborar com a crítica das atuais transformações político-ideológicas que vêm ocorrendo nas universidades “públicas” do Estado de São Paulo, notadamente neoliberais (elitistas, privatizantes e antimarxistas). Para além das críticas ao atual sistema, o livro também objetiva auxiliar os educadores no empreendimento de uma ruptura com a educação burguesa, vislumbrando a possibilidade de o proletariado conduzir, no futuro, sua educação de forma autônoma e liberta.
Logo nas primeiras linhas da introdução, o autor assume sua filiação marxista ao afirmar que é impossível pensar a educação de forma abstrata e separada da vida social. Na realidade, para compreender a educação (e o ensino) é fundamental articular estas ao modo de produção da vida material por meio do materialismo dialético.
Nesse sentido, de acordo com Lombardi, não podemos entender a educação ou qualquer outra esfera da vida social descoladas do contexto histórico em que surgem e se desenvolvem. Foi assim que “Zezo” como o autor é popularmente conhecido abre o primeiro capítulo do livro denominado: “Iluminismo e enciclopedismo: luzes, progresso e revolução”. Nesta parte, ocorre uma contextualização do período histórico em que surgiu o pensamento de Marx e Engels, informações que são essenciais para se entender as formulações que os comunistas fizeram acerca da educação.
Expondo a sua concepção teórico-metodológica da História, por meio dos escritos de Marx e Engels, Lombardi escreveu o capítulo 2: “Minhas referências de análise, as balizas do marxismo”. Neste trecho, são analisados os pressupostos da concepção materialista dialética da História, o que implica trabalhar com três categorias fundamentais: “Revolução”, como o processo de transformação das estruturas econômica, social e política (seja de um modo-de-produção ou de um regime social); “Luta de classes e esta como motor da História”, onde não existe solução na conciliação ou dialogo e sim no sangrento embate entre as classes antagônicas e a “Violência e leis do desenvolvimento da história humana”.
Adentrando-se no terceiro capítulo: “A categoria modo de produção e o princípio da união entre ensino e trabalho”, Lombardi analisa as relações entre a educação e seus profissionais, entendendo que este campo não foi constituído por meras ideias subjetivas, abstratas, sobrenaturais ou místicas, mas em consonância com os aspectos materiais e objetivos, que correspondem às forças produtivas e relações de produção articuladas aos diferentes modos e organizações de produção, historicamente construídas pelos homens e particularmente consolidadas nas mais diferentes formações sociais.
Assim, compreender a História da Educação é analisar o processo histórico de transformação das relações do modo de produção e a educação, aspectos explorados no capítulo 4: “Análise marxiana sobre educação no modo capitalista de produção”. Em decorrência dos objetivos do capital, a educação que o Estado burguês destina à classe trabalhadora é extremamente precária, aparecendo como mera exigência legal, graças às lutas e reivindicações proletárias ou como “regulação” da burguesia, que por meio da instrução, ideologiza a exploração capitalista como algo “natural”. Ademais, a revolução industrial capitalista aprofundou a divisão e a simplificação do trabalho, repercutindo na falta de importância que a burguesia passou a depositar na qualificação dos operários, ou seja, para se apertar botões não existem grandes necessidades de instrução[1].
O capítulo cinco é reservado ao estudo que Lombardi fez acerca do “Trabalho e instrução das crianças trabalhadoras”, onde é destacado um cenário de ignorância e analfabetismo, tanto entre os professores das escolas populares como entre os operários. Nesse quadro social, na Inglaterra do início do século XX, os trabalhadores eram “banidos” do acesso à cultura clássica, que constituída coletivamente na História da humanidade foi apropriada e acumulada, de forma privada, pela burguesia que, enquanto classe dominante, boicotava aos trabalhadores o acesso a estas informações por temor de seus efeitos “perigosos” ou “subversivos” ao status quo. Já a demanda que os proletários tinham por educação para seus filhos produzia um efeito “artificial”, pois, a longa jornada de trabalho das crianças impossibilitava o aproveitamento escolar[2].
Após discorrer sobre a precária educação da classe trabalhadora, a última parte da obra é baseada em “encaminhamentos” expressos no capítulo 6: “Fundamentos da proposta pedagógica comunista - Marx e Engels”. Aqui se encontram as propostas que os comunistas fizeram para a educação dos trabalhadores de sua época. Entre as principais “bandeiras” estavam: o fim da exploração capitalista das crianças que trabalham nas fábricas; junção entre educação e formação e produção material; educação politécnica que desenvolva a omnilateralidade nos homens, o que envolve uma formação articulada entre exercícios mentais, físicos e técnicos, configurados conforme a idade das crianças, jovens e adultos; indissociabilidade da educação e da política; união entre tempo livre e o tempo de trabalho, ou seja, o trabalho, o estudo e o lazer.
Estas “bandeiras” para a educação foram entendidas como fundamentais instrumentos de desalienação dos trabalhadores, e, portanto, um meio para encravar a revolução proletária. Para esta estratégia também era fundamental exigir uma educação estatal, gratuita, laica, obrigatória e universal, aspectos da ideologia socialista que foram apropriados pela burguesia na sua luta política e ideológica contra o proletariado.
Em linhas gerais, o livro corre de forma clara, didática e sem neutralismos, onde Lombardi colabora com uma atitude propositiva. Para o autor, em tempos de defesa apologética da irracionalidade, da subjetividade, do fragmentário, do microscópio, da ideia e do particular, os educadores não possuem motivos para ficar na retaguarda, “[...] precisamos resgatar as armas teóricas de um ponto de vista que vislumbre a materialidade [...]” (p. 239), a objetividade, a racionalidade revolucionária e a totalidade histórico-social.
Rodrigo Molina
Historiador e doutorando em Educação na Universidade Estadual de Campinas. Pertencente ao grupo de estudos "História, Sociedade e Educação no Brasil" (HISTEDBR).
[1] A exceção da regra é a formação especializada dos “capatazes”, um diminuto pessoal encarregado do controle e gerenciamento dos processos produtivos.
[2] Contemporaneamente, Lombardi entende que a estrutura desse sistema de exploração não se alterou
Esta resenha foi publicada pela primeira vez na Revista Germinal: Marxismo e Educação em Debate em 2012.
Esta resenha foi publicada pela primeira vez na Revista Germinal: Marxismo e Educação em Debate em 2012.
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